sexta-feira, 3 de abril de 2009

Escutismo



Às vezes acontece-me, ao falar, ter dificuldade em organizar diversas ideias, de forma a dizer o que quero, de uma maneira clara, simples, eficiente. É mais fácil quando se escreve: tem-se tempo para pensar, apagar o que está mal e voltar a escrever. E mesmo assim muitas vezes não se obtem o resultado desejado.

O Escutismo tem sido uma parte importante da minha vida. Creio poder dizer que a terá mudado substancialmente. Ao longo de mais de 30 anos fiz um pouco de tudo: pata tenra, guia e sub-guia de patrulha, chefe de exploradores, pioneiros, caminheiros, presidente da comissão fiscalizadora regional, chefe de agrupamento. Nunca fui candidato a nada, nem nunca vi qualquer cargo como reconhecimento de coisa alguma, ou de evolução: apenas, em cada altura, era preciso dizer sim. Tive um bom exemplo, o do Mário Leite. Com ele aprendi a magia do escutismo e vi um dirigente criativo, simples, amigo, sem outra ambição que não fosse estar ao serviço dos jovens. Quando eu preparava uma reunião para os exploradores e lhe mostrava o plano, lá vinha a pergunta "e o sumo? o que lhes queres transmitir?". Acima de tudo coerente: vive de acordo com o que prega. Ah...aprendi também a andar mal uniformizado.

Com ele terá nascido uma certa filosofia de ser Bonfim, tendo as equipas de caminheiros um papel muito importante na vida do agrupamento. O essencial é a formação dos jovens e a transmissão dos valores do movimento. Ajudar os miúdos a serem homens de fé, felizes, solidários, criativos, responsáveis. Nós, os mais velhos, apenas estamos enquanto formos precisos. E agora é tempo de ser preciso um novo chefe de agrupamento.

Quero só passar para o papel (!) algumas convicções sobre o escutismo e como vejo o ser dirigente:

1- A nossa Lei diz " o escuta É... leal... honrado... puro... irmão... útil...". Não diz "deve ser". Será utópico pensar então que as equipes directivas, ao nível de secções, agrupamentos, núcleos, regiões, etc., devem ser exemplo de harmonia, dedicação, humildade e partilha? Funcionando sem necessidade de "galões", hierarquias e reprimendas? Liderando, no necessário, aquele que está, no momento, mais disponível, mais "inspirado", com maior capacidade de entrega? Dir-me-ão: "isso só numa sociedade ideal". Mas não é isso mesmo que o escutismo prega? Andamos a dizer aos miúdos para seguirem o exemplo dos patronos (santos) e vemos agrupamentos, núcleos e regiões onde existem lutas por cargos, tal como na política ou nas empresas. Onde está a diferença do "modo de ser escutista"?

2- Ser dirigente exige que se crie, que se invente para dar. Um dirigente é um formador de jovens. Exigem-se capacidades (manuais, ou culturais, ou intelectuais, sempre...humanas). São os "talentos" que se têm de pôr a render. Não é só pôr os miúdos a cantar aquela canção, ou a fazer o jogo que alguém inventou. É escrever novas histórias, é inventar jogos nunca jogados, é criar novas canções, construir dragões...

3- Ser dirigente às vezes dói. Não basta dar o que se tem, quando se pode. Às vezes dá-se o que se não tem, quando não se pode. Fazem-se sacrifícios, porque é preciso. Porque o acampamento tem de acontecer, porque não posso faltar à reunião, porque tenho de ir àquela missa, apesar de dar o jogo que decide o campeonato. Em casa, exige-se trabalho de inspiração e transpiração: têm de se levar ideias para o jogo, temos de estudar o tema do debate, é preciso fazer o guião das promessas. O dirigente não anda no escutismo porque gosta. Anda porque tem uma MISSÃO.

4- B.P. dizia que, se tivesse de escolher um cargo no escutismo, escolheria o de guia de patrulha. A mim faz-me um bocado de confusão as ambições de alguns, cujo objectivo maior é ser chefe de núcleo ou regional. Sempre vi o escutismo como uma pirâmide invertida: em cima, estão os mais importantes - os lobitos, os exploradores, etc. Em baixo, os dirigentes, que só existem em função dos outros.

5- Ser dirigente exige coerência. Não podemos falar do Homem Novo e não sermos católicos (o praticante é redundante). Não pudemos falar de pureza e dizer palavrões. Não pudemos falar de higiene e não pegar numa vassoura quando o chão está sujo. Não podemos falar de serviço ao próximo e não aparecer sempre que o agrupamento chama. Ou então seremos dos que dizem que uma causa, além de justa, deve ser oportuna. Os jovens devem poder tomar-nos como exemplo: não só das nossas palavras, mas sobretudo das nossas acções.

6- Um agrupamento vivo e saudável deve gerar adultos dispostos a dizerem "sim, aceito" quando de servir se trata. Gente que esteja disponível para servir, por exemplo, como chefe de agrupamento, com humildade, com vontade de melhorar o que está mal e de manter o que de bom se faz. Que saiba ser garante da continuidade da instituição, mesmo com sacrifício pessoal. Que seja capaz de compromissos e rupturas. Mas sempre à imagem de B.P..

Enfim, como diz a oração: "ser generoso, dar-me sem medida, gastar-me sem esperar outra recompensa que não seja saber que faço a Vossa (não a minha) vontade".

É difícil? É.
Conseguimos? Às vezes.
Mas devemos tentar, sempre da melhor vontade!

2 comentários:

Anónimo disse...

SER DIRIGENTE.............................................................

é lindo ver as crianças crescerem, é lindo saber q tocaste e foste tocado; e quando não te achas exemplo?e quando te sentes frustrado por quer dar mais e não saberes como? como podes ser explemo quando tu não te sentes exemplo para ti mesmo?

é complicado?é muito, se sou a pessoa que me orgulho de ser hoje só o devo ao bonfim, ou em grande parte o devo.

mas será que essa divida não esta paga?será que se ve o quanto doi ir la?mm que disfarce, mm que ninguem veja, eu vejo e doi.

Como posso transmitir uma mensagem de amor de paz de união, quando eu não sinto isso?

Quando a minha vontade é chorar e fugir?é sair da minha vida rotineira e partir a descoberta, e criar laços longe.

Uma vida sem desafio é uma vida morta, é o que sinto da minha.

teve desafios enormes conquistas lindas, mas esta parada; e não pode.


E tu dirigente??

pensamos sempre nos miudos e nas suas dificuldades, e nas nossas?
ajudamos os miudos no que podemos, e a nós? quantas vezes estendemos a mão ao dirigente??

pois isso desgasta quem precisa da ajuda, quem nós sugamos sem vermos.
e faz de nós dirigentes para miudos e não exemplos a seguir, mas sim utopias para distrair.




No fim veremos os leais os guerreiros, mas em todas as guerras ha baixas.

Anónimo disse...

Há coisa de duas semanas, tive uma conversa com um dirigente que me deixou muito triste. Mea culpa. Nas nossas correrias, com as nossas preocupações "de manutenção da casa", muitas vezes somos distraídos uns com os outros e muito pouco sensíveis e amigos. Desculpa, MPP. A gente fala.
Bjs