domingo, 1 de junho de 2008

Línguas mortas, palavras vivas

A pequena e simples hitória que vou contar, não me foi contada, já que eu estava presente. Tratava-se de um seminário ao qual assistiam cerca de 250 pessoas. O tema era a segunda encíclica de Bento XVI, intitulada "Spe salvi". Será escusado traduzir, porque os poucos (mas bons) leitores deste blogue saberão de imediato que quer dizer "Salvos na esperança", uma vez que o latim é uma língua que dominam plenamente desde pequenos. Eu, por exemplo, lembro-me perfeitamente quando, em criança, após me ter portado mal, a minha mãe ao dar-me uma sapatada, me dizia: "a teneris consuescere multum est" (de pequenino se torce o pepino), ao que eu, choroso, respondia "ab alio spetes alteri quod feceris" (quem faz o mal, espere outro tal). O latim, hoje uma língua morta, tornou-se através da Igreja a língua dos académicos e filósofos medievais europeus e é, ainda hoje, a língua oficial da Cidade do Vaticano. Mesmo as personalidades que visitam o Vaticano falam em latim. George Bush, por exemplo. Na última visita apercebi-me perfeitamente do Santo Papa ter dito a Bush: "non in solo pane vivit homo". A que Bush respondeu, num latim fluente, com uma pequena pronúncia texana: "qui nescit dissimulare, nescit regnare". Bem, voltemos à hitória e às coisas sérias. Como já referi, do lado de baixo estavam os tais 250 leigos (termo giro, este). A presidir à sessão, dois Bispos Auxiliares. Um dos Bispos procedeu a uma dissertação sobre a encíclica e, em seguida, passou-se a um período para colocação de questões sobre o tema, que seriam respondidas seguidamente pelo Bispo. Iam as questões a meio, quando uma senhora de idade se levanta e diz: "estou com dificuldades no meu casamento. O Sr. Bispo podia-me dizer alguma coisa?" A plateia ficou silenciosa e embaraçada. Ao mesmo tempo fiquei curioso: que iria o Bispo dizer? Eu digo-vos o que disse: rigorosamente nada. Nem uma palavra. Era como se a senhora não tivesse nunca feito a pergunta ou não existisse. Pensei no que ela deverá ter sentido. Se calhar apercebeu-se de que a questão fora totalmente despropositada e ficou cheia de vergonha, pensando que não era digna sequer dum comentário. Ou então, que o seu problema era irrelevante para os outros. Confesso que esperava do Bispo outra atitude. Um simples "é preciso ter esperança" ou "falo consigo lá fora" ou "vou rezar pelo seu casamento". Mas, reflectindo melhor, se calhar esperava mesmo o silêncio. Porque a grande maioria dos mortais, há medida que sobe na hierarquia, vai-se tornando mais distante, mais importante, e já não tem tempo, nem paciência, para os pobres e os ignorantes. O seu tempo é para ser gasto com outra gente importante como eles, ou para estudar latim ou encíclicas. Confesso que nada sei de latim; pouco sei das difíceis encíclicas de Bento XVI. Mas sei que o Homem mais importante que já calcou este nosso planeta, usava parábolas para que até as crianças o entendessem e que os seus discípulos falavam línguas estrangeiras, que não conheciam, para chegarem a todos. O Homem mais importante de todos, ensinava a humildade e tinha tempo e atenção para o mais leigo dos homens. Pois como muito bem dizia o Sr. Bispo Auxiliar: "quem ama tem tempo" e sempre um gesto de atenção, acrescento eu.

8 comentários:

Anónimo disse...

Muito boas palavras tu proferes.
Não estará o Cristianismo como o Latim?? Não me refiro à espiritualidade, ou à fé - sendo que considere a esta um sinónimo de espiritualidade, pois fé será (no meu ponto de vista) algo acima dele a acreditar para sobreviver, seja o que for. Todos temos algo superior a nós em que acreditar (seja ele terreno ou não), eu prefiro os terrenos. Pois visam mostrar que é possível ser-se feliz, é possível ser-se humano e errar, é possível sonha e ir longe. Tenho inúmeros Ídolos e Ídolas. E confesso ter dificuldade em acreditar em algo que não seja visivel. Também acredito que possa a acreditar em Tais futuramente, mas não de momento.

Penso que o Cristianismo (e volto a dizer ,para mim) será como foi traduzida numa reunião de um grupo de jovens sentados no palácio de cristal, uma metáfora de esperança para a vida. E realmente nunca tinha pensado sob esse prisma, o que me levou a pensar: "Faz todo o Sentido!" E se puder acreditar dessa forma, posso dizer acredito.

Farto-me de mentiras subjacentes pelas mensagens de "Personas" (pseudo-)importantes no mundo do cristianismo. E pessoas que deles tentam viver.
Falo de alguém (idosa) da minha paróquia, que durante um daqueles momentos mortos durante a missa perguntei ao meu amigo do lado onde poderia fazer um Raio-X à mão para verificar se estaria tudo bem com ela, na qual dirige-se a nós essa mesma "persona" e manda-nos calar com um tom de quem era rainha de alguma coisa e diz de seguida que já tínhamos idade para isso. Sendo que logo de seguida olho eu para trás e vejo essa mesma "persona" a conversar com outra "persona" agitando o seu casaco (durante o discurso) e quando repara em mim de imediato para a sua conversa e dá um passos em frente, distanciando-se da sua companheira.
Mas que autoridade (ou seja o que for) terá esta mesma "persona" sobre mim? Confesso que se a estivesse a perturbar, daria-lhe razão. Mas não era o caso, visto ter feito apenas uma pergunta e num tom baixo.

Bom, mas se é isto e o seu companheiro de quarto (quero dizer casa) que O Senhor Lá de Cima reflecte a sua imagem aqui na Terra, vou ali e já venho. Isso é só mais um factor para o seu Descrédito. Mas não quero discutir isso, visto achar que cada um vê a sua fé à sua imagem.
E sim, apesar de não ser grande cristão, tinha um carinho especial pelo Papa João Paulo, dado a sua humanidade para com os Homens e como tu referes, as crianças. Este novo ser supremo não traduz este feito de uma forma tão exacta, mas esperemos. Esperemos que um dia essa tradução seja feita de uma forma mais mágnifica e que as crianças cresçam com isso.

SP

Anónimo disse...

Estou chocada :o

Isto foi vero? No Sábado de manhã?

Fico astonished com a tua latinice... Mesmo que seja tudo inventado, eu acredito pq não sei melhor... Mas soa bem...

Por acaso tenho um professor que nos fala latim nas aulas... Mas é de um mundo à parte... Muito à parte

Agora, não concordo absolutamente nada que quando as pessoas "ascendem" se tornam importantes... Considero é que aquelas que mais numericamente sobem por aí acima são as gananciosas e desalmadas q efectivamente pretendem compensar alguns recalcamentos da vida... Normalmente, as que guardam tempo para amar, mar ter gestos de ternura, ficam com menos margem de manobra para se dedicar a subir degraus...

As pessoas boas, simples, verdadeiras vão sempre sê-lo, estando onde estiverem. Disso, não há melhor exemplo que o nosso querido J.C. ...

Tenho a felicidade de poder dizer que vivo uma Fé saudável que permite perguntar a certas e determinadas pessoas, com alguma confiança: "Onde é que está a tua nave?".

Enfim... A falta de sono descompensa-nos...

Gosto deste espaço para descomprimir :D

Beijinhos a todos os eruditos que por aqui passam***

Vou estudar que estou "in albis" para as frequências de amanhã (mas vou tirar 15 :p)

Anónimo disse...

Lol Sérgio, só agora reparei que professaste o nome de 3 pessoas bastante peculiares nesse teu último parágrafo... Duas delas o
Narciso da Grécia e a bruxa má :D

Eu chamava a TVI e fazia uma revindicação. Se o Jornal Nacional faz reportagens de cabras que saltam telhados (incrível), também havia de fazer destas peculiaridades surreais :p

Anónimo disse...

Pessoal: este blogue é pura ficção, qualquer semelhança com a realidade é pura coincidência...Logo...

Não é o caso das latinices,que estão todas correctíssimas e sem sequer sotaque texano.

SP: se vires um escuteiro a dar um pontapé num cão, poões em causa o escutismo? Em todo o lado há pessoas boas e más. Não podemos julgar instituições, movimentos, ideais, pelo comportamento de meia dúzia de energúmenos. Também em relação às religiões isto é verdade: a Igreja da Inquisição, do silêncio perante o Holocausto e das Cruzadas, é a mesma da Madre Teresa de Calcutá, dos Missionários, dos padres que trabalham com pobres e doentes. Somos nós todos, carregados dos nossos vícios e virtudes. Depois há o outro plano: o Divino, o de Deus. Aí tenho quase a certeza que não há defeitos. Muitas coisas não entendo, mas acredito que tenham toda a lógica. Pensa nisto: dizes que não acreditas no que não vês. Se visses, onde estava a magia do Acreditar? Se vissemos Deus, até Hitler teria sido um bom católico, pois saberia o que lhe aconteceria se não o fosse. Creio que Deus nos respeita tanto que até nos dá a liberdade de mostrar quem realmente somos ou queremos ser, sem impor a sua presença, que não seja de uma forma de vozinha cá dentro. Podes ter os modelos que quiseres, mas melhor que J.C. é difícil: olha para o Novo Testamento e procura um defeito no Homem: nasceu pobre e como qualquer outro homem, gostava dos pobres e das crianças, mandava perdoar 77 x 77 vezes, falava de festas para os filhos pródigos, não gostava de fariseus, dizia que o maior mandamento era amar o próximo, à mulher adúltera disse que não a acusava e pediu-lhe que não voltasse a pecar (saindo de uma enrascada de uma forma genial) e morreu de uma forma terrível, bem humana, dizendo que não há amor maior do que aquele que dá a vida pelos irmãos. Se tenho de ter algo que me leve a pensar não nos próximos 2, 20 ou 80 anos, mas em termos de eternidade, creio que prefiro este Homem a que qualquer metáfora.

Abraços.

RM

Anónimo disse...

E o sábado de manhã também foi vero!

Anónimo disse...

Bom dia!

Apesar de seguir este blog "camuflada" e em silêncio, este último post fez-me lembrar uma história:)

O TiManel, era o filho mais novo de uma família, era o tio que mais traquinices fazia com os sobrinhos, que devido à proximidade de idades parecia o irmão mais velho; aos 10 anos resolveu ir para o seminário, era a possibilidade de puder estudar, de sair de uma pequena aldeia de Trás-os-Montes; aos 20 anos, e após um percurso de maturação, fez os seus primeiros votos, acompanhado por um voto de pobreza, era agora um dehoniano. O seu percurso passou por diversas bifurcações, mas sempre relacionadas com os jovens, com o estudo e com a inteira dedicação aos outros, mas nunca esquecendo a família. Teve anos em Moçambique a dar aulas e a acompanhar a comunidade dehoniana, voltou directo para Roma para se dedicar aos estudos da Santa Igreja, e no regresso voltou ao seminário de Aveiro. Aveiro era o seminário que acompanhava a etapa final do percurso de cada futuro padre. Era o responsável pelo seminário, cuidava da horta e tinham uma enorme gaiola de periquitos e codornizes. Ainda me ofereceram 1 casal “abençoado” de periquitos. Durante todo este tempo era o tio (meu tio avô) mais fixe  fazia magia, ensinava a tocar piano, contava anedotas, cantava e tocava guitarra para nós, ligava sempre nos aniversários, trazia prendas religiosas que sempre achamos ser uma preciosidade, recebíamos apertões de cumprimento, era sempre o TiManel. Eu e o meu irmão éramos e seremos sempre os primeiros sobrinhos . Entretanto foi nomeado para responsável nacional pela comunidade dehoniana, as viagens eram sempre muitas, acompanhadas de lembranças para usufruirmos em comum, muitos postais de regiões de toda a África, e principalmente de muitas histórias. Começou a enviar fotos com todos os escuteiros que encontrava, afinal agora tinha sobrinhos que eram escuteiros, e sempre foi um motivo de “orgulho”, nunca demonstrado, nós éramos e continuamos a ser os sobrinhos do Porto que são escuteiros, “então tu és a sobrinha do Porto, do Manuel que é escuteira, Mazouco está bonita como sempre? (D. Manuel Clemente Nov. 2007). Passados alguns anos, o TiManel avisou que estava com um problema, mas que não poderia dizer mais nada para já, ficamos todos alarmados, o tio estava doente! Mas não, tinha sido contactado pelo Papa João Paulo II, tinha sido proposto para Bispo Auxiliar do Algarve e ele tinha aceitado, como vontade da Igreja! Teve que renunciar ao voto de pobreza, começou a ganhar o primeiro ordenado e ia viver para o Algarve. Foi uma festa, toda a família correu para o Algarve, a aldeia e todos os amigos também, afinal era o bispo mais novo de Portugal, e era o TiManel. Sentia-se ridículo vestido de púrpura, escolheu o báculo mais simples, de madeira, e incomodava-lhe o anel. Mas continuava a ser o TiManel, agora íamos para o Algarve para ele puder ir para a praia connosco, comíamos gelados em Faro, fizemos sardinhadas na sua casa e ainda tive direito a uma serenata quando fiz 18 anos. Mas o TiManel não era o bispo principal e por isso tinha que seguir o que a diocese e o bispo diocesano queria para a região do Algarve. Anos mais tarde foi nomeado Bispo Principal e agora podemos ver a sua mão na região do Algarve. Visita todas as escolas, infantários e comunidades do Algarve no Algarve e fora dele, canta a Floribela e o Ruca com as pequeninos, foi com os casais do Algarve para Jerusalém no mês que a crise se intensificou nesta cidade, levou os jovens a Taizé, reuniu 10.000 pessoas em Faro para acolher a Imagem Peregrina de Fátima, reza com todos e entre todos, criou um sistema de e-mails para todas as paróquias, têm um portal na internet, os grupos de jovens estão ainda mais rejuvenescidos, há mais escuteiros, há mais padres, mais pessoas felizes, mas continua a ser o TiManel. Fala um porrada de línguas, e quem teve no meu aniversário o ano passado sabe como toca guitarra e toca cada um que está à sua volta, tem 59 anos e poderia ser o avô mais babado de todos os seus netos, mas é apenas o TiManel. Este TiManel é Bispo e apesar de todas as imposições que o cargo assim o exige, continua a ser o mesmo, é verdade que está mais “elevado”, mas continua a ser o mesmo que sempre me acompanhou ao longo destes anos.

Esta é a história do TiManel, e achei que devia partilha-la com vocês, há realidades que infelizmente não se generalizam, e por vezes o génese da natureza humana vem mesmo ao de cima.

Ana

Anónimo disse...

Ana

A história é como tu...5 estrelas.
Obrigado

Beijinho

RM

Unknown disse...

Realmente o " TiManel" é uma pessoa empolgante e que toca viola como deve ser...mesmo. É sem dúvida, uma daquelas pessoas que faz muita gente acreditar nas palvras do evangelho.
Quanto ao comentado aqui a minha opinião é muito simples.....há o clero que "faz" e há o clero que "diz"....há o clero que "agita" e há o clero que "não quer agitãções"...!

Acho que duas formas de vermos isso, nas vivências dos dois ultimos PAPAS....o meu amigo João Paulo II, o peregrino, e Bento XVI. Não me parece que existam duvidas quanto às diferenças dos dois.
Para além destes, temos de certeza bem perto de nós padres com estas caracteristicas.....não vale a pena referir casos, pois todos nós conhecemos alguns que são tipicos dos perfis que falo.

Certo, certo é que o primeiro de todos guiou-nos muito bem e foi claro no que fez e no que disse(isto se ninguem detorpou as suas palavras com o tempo, é claro :) )....falo pois de, Jesus Cristo, o Homem como qualquer um de nós.

Abraço grande chefe...até breve.

Mário